sexta-feira, 11 de março de 2011

Incoerências na canção "Sabor de Mel" (!?)


Primeiramente preciso ressaltar que minha intenção com a análise imparcial desta letra, não é de forma alguma expor a interprete da canção em apreço, nem muito menos destituir de qualificações espirituais aqueles que se adaptaram e praticam a execução da referida melodia. Portanto, não há como fugir de consistente contestação frente às incoerências apresentadas no famoso hit evangélico, tão tocado, ouvido e cantado em nosso âmbito eclesiástico.

Destarte, é natural que tal canção tenha alcançado sucesso e tão grande aceitação em nosso meio, pois a síntese de sua mensagem aborda justamente aquilo que buscam uma boa parte, senão a maioria das pessoas que freqüentam ou congregam em igrejas evangélicas, ou seja, vitórias, conquistas e exaltação.

Não sou contrário, portanto, ao fato de sermos vitoriosos, pois é inegável que isto faz parte do propósito de Deus para nossas vidas. Porém, o primeiro aspecto a ser observado quando se trata de louvor a Deus é que este deve ser inteiramente direcionado para Ele, com o intuito de remeter-lhe glórias e não para a igreja ou para pessoas em especial. Portanto, quando ouvimos alguém dizendo: “fulano(a) canta bem, mas ninguém recebe”. Claro que ninguém recebe e nem deve receber, pois o louvor não é direcionado para mim, nem para você caro leitor, este deve ser direcionado para o Criador, pois trata-se de sacrifício de louvor, e sendo assim, só ele pode ou não receber.

Além de ser direcionado a Deus, o louvor deve ser uma proclamação do evangelho de Cristo e apontar para a mensagem da cruz, que leva a uma vida de renúncias, santidade e salvação, por intermédio do qual o nome de Cristo é glorificado.

Quem te vê há de falar, 
Ele é mesmo escolhido.
Vão dizer que você nasceu pra vencer 
Que já sabiam porque você 
Tinha mesmo cara de vencedor,

Aqui inicia o processo da exaltação humana, como se nós possuíssemos algum mérito pessoal naquilo que fazemos. Devemos ter muito cuidado com as motivações objetivas e subjetivas.

Quem te viu passar na prova e não te ajudou, 
Quando ver você na benção vão se arrepender, 
Vai estar entre a platéia e você no palco, 
Vai olhar e ver Jesus brilhando em você,

Aqui a tônica não tem nada haver com o sabor do mel que representa doçura, mas em vez de doçura que é sinônimo de paz, tem sabor de vingança. Porém a mensagem de Jesus é totalmente adversa. Vejamos Lc 6.31: “E como vós quereis que os homens vos façam, da mesma maneira lhes fazei vós, também.” Não devemos nos alegrar por estarmos em privilegiada posição enquando alguém que por algum motivo não tenha nos estendido a mão, agora pereça; mas nossa alegria deve ser conivente com o texto de Lc 10.20: “(...) alegrai-vos antes por estarem os vossos nomes escritos nos céus.”

A figuração entre a platéia e o palco alude taxativamente ao antropocentrismo, ou seja, a exaltação humana. Quando o momento deveria ser para exaltar a Deus, a criatura acaba roubando o foco da adoração.

Ainda as frases: “Quem te viu passar na prova e não te ajudou, quando ver você na benção vão se arrepender...”, é totalmente incoerente com o que escreve o apóstolo Paulo em Gl 1.10: “Pois busco eu agora o favor dos homens, ou o favor de Deus? Ou procuro agradar aos homens? Se estivesse ainda agradando aos homens, não seria servo de Cristo”.

Quando Deus nos tira da prova, não é para mostrar para os demais o quanto nós somos queridinhos e vencedores, mas porque o propósito divino já foi atingido.

Lembremos ainda do texto de Jo 3.30:

“É necessário que ele cresça e que eu diminua”.

No demais, quem sobe em palco é artista e tal nós não somos; ao menos não desejo ser. Entretanto, quem neste lugar sobe, o faz com o intuito de ser visto, aplaudido e reconhecido, mas nosso foco como cristãos é outro, é distinto deste, fomos chamados para sermos servos de Cristo e uns dos outros.

“Mas entre vós não será assim; antes, qualquer que entre vós quiser ser grande, será vosso serviçal; E qualquer que dentre vós quiser ser o primeiro, será servo de todos. Porque o Filho do homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos.” (Mc 10.43-45).

Concluindo minha breve consideração, não posso me esquivar de afirmar que tal composição possui sim algumas frases coerentes, não é de todo condenável, porém, o que reprovo aqui é a tônica apresentada, que sintetiza e canaliza as atenções humanas para o próprio gênero humano, objetivando a vitória de uns em detrimento da derrota de outros,  o brilho de alguns contra o ofuscamento dos supostamente opostos, que são qualificados como inimigos.

Para reflexão (Mt 5.44): “Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus;”

Fraternalmente em Cristo,

A.S.M

Um comentário:

  1. Meu comentário (L.M.G.):

    Excelente matéria!
    Mesmo antes de eu ouvir alguém alertar sobre a letra, eu já havia percebido algo diferente. Não ruim, mas fora do padrão de louvor que conhecemos.
    Talvez por isso essa canção não tenha me tocado da maneira que outros cânticos de adoração ao SENHOR fizeram, nem fez parte da minha seleção de louvores favoritos. E olha que gosto de muitos!
    Mas, sinceramente creio que a intenção do autor e da intérprete não tenha sido a de exaltar o homem, e penso que a maioria das pessoas que a ouvem não percebem algo de incorreto, porque sentem que se trata de um cântico de vitória de alguém que foi exaltado por Deus, e que agora dá testemunho disso e reconhece o poder de Jesus.
    Veja outros trechos da música, que comprovam a intenção de falar do amor de Deus:

    ''O agir de Deus é lindo na vida de quem é fiel.
    No começo tem provas amargas,
    Mas no fim tem o sabor do mel.
    Eu nunca vi um escolhido sem resposta,
    Porque em tudo Deus lhe mostra uma solução,
    Até nas cinzas ele clama e Deus atende, lhe protege,
    lhe defende, com as suas fortes mãos...''

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